23.9.16

Saber o sexo antes das ecografias - parte II


Saber o sexo antes das ecografias - parte I


Eu queria muito ter uma rapariga. Mesmo. Eu posso vir a ter rapazes, mas eu queria ter pelo menos uma rapariga, só uma, era um desejo enorme desde sempre caso viesse a ter filhos.

Mas depois olhava à minha volta, constatava que só nasciam rapazes e quase nada de raparigas. Além das minhas relações pessoais serem 80% a 90% de gravidezes para rapazes (tem sido incrível), verificou-se este ano que a turma da minha sobrinha é uma vergonha, praticamente não há miúdas, estão em evidente minoria.

Por curiosidade, fui consultar o PORDATA e verifica-se:

- Em 2011 nasceram 47.021 rapazes para 44.679 raparigas.
- Em 2012 nasceram 43.840 rapazes para 41.466 raparigas.
- Em 2013 nasceram 40.100 rapazes para 38.506 raparigas.
- Em 2014 nasceram 40.393 rapazes para 37.919 raparigas.
- Em 2015 nasceram 41.561 rapazes para 39.713 raparigas.


Queria uma herdeira, alguém que calçasse os meus sapatos e quisesse vestir os meus bikinis, uma vaidosa que se orgulhasse e interessasse pelo meu trabalho, alguém que, quem sabe, pudesse desenvolver gosto no que faço e querer participar, mas achava tudo isso altamente improvável, eram desejos a mais. Então procurei mentalizar-me desde o teste de gravidez que iria ter um rapaz. Pensava que tenho tido tanta sorte na vida que não ia ser correspondida no meu desejo quanto a este pedido, eram demasiados pedidos.

Trabalhei a minha cabeça, mentalizei-me, convenci-me, procurei sempre imaginar que seria um rapaz. Fiz o teste de sangue logo às 8 semanas como contei neste texto e que permite saber com 99% de certeza o sexo do bebé. Aguardei que me contactassem a dar o resultado.

Dias depois de ter retirado sangue, ligaram-me, estava sozinha em casa, ninguém por perto. Só eu sabia que tinha ido fazer o teste e o pai da criança achava que iria fazer só na semana seguinte. Naquele momento, com a chamada em linha, o meu coração disparou, era agora! Feita a introdução da chamada e todas as explicações, suspirei, pedi "então vamos a isso" aguardando pela resposta do lado de lá, fechei os olhos para concentração e aguardei ouvir o resultado.

Estava mentalizada para um rapaz, era o mais provável, mas tinha em mim aquela pequena esperança persistente. E então ouvi:

- O resultado é "sexo feminino", uma menina.

Abri os olhos de espanto. Teria ouvido mal? Pedi à senhora para confirmar, confirmou. Eu devo ter respondido com a voz mais feliz do mundo do outro lado do telefone. Agradeci a chamada e despachei o assunto para poder estar sozinha.

Tapei a boca com a mão de tal surpresa. Era o eu queria, mas mal acreditava. Eu quis tanto, mas mentalizei-me para rapaz para evitar a desilusão. Afinal teria uma rapariga como desejava.

Em toda a gravidez nunca senti alterações hormonais. Zero. Nunca fiquei mais sensível ou mais enervada, nunca me revelei um pain in the ass, não fiquei chata, não fiquei de lágrima fácil, o meu feitio não se alterou e, na verdade, se alterações houvesse a registar, seria de boa disposição. Ando tão contente e bem disposta com o mundo que quase sou capaz de gostar de animais (quase, não abusem).

Mas naquele momento em que fiquei sozinha com a minha filha na barriga foi o único momento em toda a gravidez que chorei, de tão feliz que fiquei. Era de felicidade. Oh, céus, até tenho vergonha de admitir isto, detesto sentimentos e descontrolo emocional, não é nada meu sempre tão dura, mas foi o que aconteceu.

O PAM não estava comigo, estava fora em trabalho, regressaria em dois dias. Não ia ligar para contar a novidade por telefone, achava uma tristeza. Então, fui a uma loja, comprei um vestido branco de bebé (a única compra que fiz), mandei embrulhar e no dia em que ele chegou voei para lhe entregar o embrulho.

- O que é isto?
- É um presente para ti!

Abriu, tirou um vestido de tamanho mínimo, olhou e perguntou:

- O que é isto?

Aaaai, vida! É preciso explicar tudo!

E ele que toda a vida tinha dito que o sexo lhe era indiferente, naquele momento percebeu, ele e eu, que afinal não lhe era indiferente. Li perfeitamente o seu inesperado sentimento de desilusão. Se calhar eu estava tão convencida que ia ser rapaz que também ele se convenceu.

- Mas o que eu que eu faço com uma rapariga? Não vai jogar à bola, não vem aos jogos comigo...

Queria um compincha de carrinho na mão e saiu todo um cenário cor-de-rosa com bonecas. Mas agora com o tempo, já o vejo a assimilar a ideia e com grandes instintos protectores.

(continua)



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© A Maçã de Eva

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