30.7.09

Pimentinha

Depois de uma tarde inteira e uma noite a palmilhar o centro e sul de Nova Iorque, lá rumámos ao Hotel, desconsolados pelo fim do dia, pelas dores nos pés, ansiando por um banho e ainda a pensar no jantar maravilhoso no Mercer Kitchen, no Soho, uns camarões deliciosos como nunca provei antes.
  
Tomei banho e deitei-me. De cabelo molhado, não quis saber da cabeleira afro com que ia acordar. Tentava fazer contas ao fuso horário teimando em não alterar a hora portuguesa, contas para o despertador que se mostravam lentas e difíceis, com as pálpebras a ameaçar fecharem-se de vez até ao dia seguinte. No duche, ouvia-o:

- F****d*-se! Ui! Car*lh*! F****d*a-se! Filha da put*, caraças! Ui! Filha da mãe! Put* que pariu! Ui! Ui! F******d*-se! Filha da put*! Uuuuuui! Merda para isto! F****d*-se! - e assim continuou por cerca de dez minutos.

Eu na cama king size, para lá de confortável, cheia de almofadas, pensava no meu raciocínio débil de cansaço: deve estar parvo...

A porta abre-se de rompante, abro um olho e lá estava ele, de toalha branca enrolada na cintura, mão na anca, expressão de a quem todos devem e ninguém lhe paga, nada satisfeito:

- Olha lá! Aquele teu gel de banho é de quê?!!
- Hum... hortelã-pimenta. Acho.
- E não me podias ter avisado??! Parece que me reguei com gasolina e ateei fogo! Tenho as partes baixas a arder!
- Wouhoohahahahhahahahhha!
- Pára de rir!
- Wouhoohahahahhahahahaha! - a rebolar da cama de um lado para o outro.
- Não sabes em que estado estou! Podias ter avisado!
- Wouhoohahahha... eu não... hahaha... sabia... hahahah... a mim nunca me fez mal... ahahhaha!

Desistiu de falar comigo e foi acabar de se arranjar. 

Caros leitores, devo informar que este gel de banho tem na pele o efeito que tem na boca o mais poderosíssimo Halls, Chiclets ou, para quem conhece, a "pior" versão de Listerine. Trouxe-o de Londres, encomendei mais duas embalagenzitas que aquilo está a acabar, mas confesso que só consigo usar aquilo no verão, em dias de calor, porque o frescor é tal que provoca frio.

Entretanto, eu continuava uma verdadeira hiena. Deitou-se protestando, sacundido os lençóis com raiva e afirmando que nunca mais aquele gel de banho pousava na sua pele. Procurei abafar as gargalhadas na almofada com medo de acordar os vizinhos de quarto, aquele regabofe já durava há que tempos.

O quarto mergulhou no silêncio.

- Wouhoohahhahahahahhaa! - não aguentei.
- Dorme!

De novo caiu o silêncio no quarto.

- Wouhoohhahahhahahah! - Durante uma hora não havia quem me fizesse dormir ou parar de rir.



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© A Maçã de Eva

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